sábado, setembro 30

Por que votar



Caros amigos de boa companhia!
POR QUE VOTAR
Um apelo em feitio de oração, na segunda pessoa.
Frei Beto

Nas eleições deste ano não te submetas ao desencanto, à inércia, à frustração, fraudando o teu voto como moeda sem valor. Lembra-te que a humanidade não conhece melhor caminho de avanço fora do processo Democrático de livre escolha dos governantes. Amesquinhar o voto é abrir espaço à corrupção, ao caudilhismo, à tirania, e rejeitar a democracia como meio legítimo e pacífico de conquistas sociais. Nas eleições deste ano, não te iludas com o marketing que aplica aos candidatos um arsenal de cosméticos capaz de torná-los todos simpáticos, confiáveis, dispostos ao mais imaculado desempenho caso se elejam. Nem te deixes enganar pela retórica dos palanques, das promessas enganosas, dos compromissos tão altruístas quanto quem dá esmolas para se ver livre dos pedintes. Investiga teu candidato, conhece-lhe os atos e as idéias e, sobretudo, a ética de suas atitudes e escolhas. Nas eleições deste ano, não te deixes saturar de nojo pela política e repúdio às instituições, pois são elas que nos permitem o acesso a direitos, sem trilhar a sofrida via do conflito armado, do terrorismo, da quebra da convivência democrática. Lembra-te que todos os detalhes de tua vida resultam da qualidade da política que predomina no país: o alimento que ingeres, o transporte que utilizas, o salário que recebes, a cidadania de que desfrutas. Se a política serve à maioria, reduzem-se as desigualdades sociais, o desemprego, a violência, a miséria e a fome. Pois tudo isso é provocado pela política que serve à minoria, ao sistema financeiro, aos credores da dívida pública, à ganância dos oligopólios e ao estéril gigantismo do latifúndio. Teu voto pode alterar ou reforçar tão injusta realidade ao eleger homens e mulheres imbuídos dessa ética ousada e dessa visão humanista que forjaram Chico Mendes, Gandhi, Luther King, Mandela e Che Guevara. Nas eleições deste ano não te deixes embalar pelo entusiasmo fácil, a música envolvente, o discurso enfático. Nem permitas iludir-te por impressões superficiais. Debate com teus amigos, lê análises, convoca candidatos à sabatina, reflete, tem clareza do projeto de nação que alimenta teus sonhos. Se te mantiveres indiferente e repudiares a campanha, outros haverão de escolher por ti e pode ser que elejam quem haverá de contrariar teus direitos e anseios. Não anules o voto. Nas eleições deste ano, avalia o teu município, o teu estado, a tua nação. O que necessita nosso povo? O que macula nossos direitos de cidadania? Quais as causas da fome, da miséria, da violência e das drogas? Por que o peso dos impostos, a falta de moradia e saneamento, de saúde e educação? Quem elege os políticos corruptos? Seja o teu voto não a expressão de tuas ambições individuais, e sim da compaixão aos mais pobres, de tua fome de justiça, de teu senso cívico, de teu projeto de Brasil para todos. Nas eleições deste ano desconfia dos que trazem o olhar arrogante, o peito estufado, o salto alto. Não cometas o erro de dar teu voto a quem se compraz na companhia de ricos e poderosos e jamais beneficiou os que lutam pela sobrevivência. Nem aos pusilânimes, aos arrivistas e alpinistas sociais. Vota com sabedoria e coragem, e empenha-te pela vitória de teus candidatos.Nas eleições deste ano, indaga-te como e em quem votariam as pessoas que admiras. Pergunta a ti mesmo quem são os candidatos preferidos daqueles que julgas exemplo de ética, de transparência cívica, de dedicação aos interesses da coletividade. A depender de teu voto, pode ser que, nos próximos anos, já não haja mais eleição, nem que se ouça a tua vontade. Mas pode ser que se alargue o espaço democrático, robusteça-se a cidadania, ampliem-se à participação popular e o controle da sociedade sobre o poder público. Nas eleições deste ano, se for nulo o teu voto, nula serão também as tuas queixas e estarás condenado à amargura cívica. À margem do processo político, teu protesto inócuo haverá de favorecer aqueles que merecem ser banidos da vida política. À tua omissão eleitoral agradecerão os que se locupletam com recursos públicos e promovem tráfico de influências, nepotismo e maracutaias. Contudo, se votares nas reformas de que o Brasil tanto necessita, como a agrária, na redução do desemprego e na conquista do desenvolvimento sustentável, com plena soberania nacional, não serão os eleitos que te agradecerão, e sim teus filhos, as gerações futuras, pois por eles e nelas estarás votando.
Frei Beto é escritor, autor de Treze Contos Diabólicos e um Angélico(Planeta), entre outros livros.
Fonte: Revista Caros Amigos, nº 111, Junho 2006.

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