quinta-feira, março 31

A Ressignificância da unidade entre o Ensino e a Aprendizagem


Prof. Geverson Luz Godoy*

A pedagogia tradicional, bancária como dizia Paulo Freire, por acreditar no depósito de conhecimento que outrora seria propriedade do professor, tinha o professor como o centro do processo Educativo, sendo este processo conhecido como magistrocêntrico.
 
Passado algum tempo, hoje compreendemos a educação de outra forma. Sabemos que o ensino não garante a aprendizagem, porém não há significado existir o ensino, caso não exista a aprendizagem. O ensino seria estéril e inútil sem a aprendizagem. Por este motivo temos acreditado nestes novos tempos, no século do conhecimento, que é necessário ressignificar a unidade entre, ensino e aprendizagem.

Falamos em ressignificação, ou seja, recriar o significado, transformar o já formatado. Para isto, na maioria das vezes é necessário desorganizar o que já parece pronto. Referimo-nos a transformação, processo onde todos são co-responsáveis por parte do crescimento. Por este motivo buscamos instrumentos de trabalho, onde o foco do conhecimento não é o professor, e sim o sujeito do conhecimento, aquele que busca o conhecer, seja ele o professor ou o aluno dentro da comunidade de aprendizagem investigativa.
   
Dentro da proposta do Centro de S.E.R. – Sistema de Ensino Reflexivo, este processo esta baseado em uma metodologia sócio-histórico-construtivista, fundamentado em uma visão humanista, onde é valorizado o conhecimento que o aluno traz de sua vida que não está vinculada somente ao banco escolar. Todo local é lugar de aprendizagem, porém na escola, podemos ressignificar o que acontece em nossas vidas, ligando o conceito com a prática. O aluno sabe fazer a prática e, o professor ajuda-o a conceituar as suas atitudes.
O conhecimento é algo que está dentro do individuo e suas relações, primeiro consigo mesmo, depois com os outros e com o mundo. O sujeito não adquire o conhecimento por meio de cópia do que lhe parece real. É através de suas capacidades, habilidades e competências, que o aluno constrói juntamente com os demais indivíduos da comunidade de aprendizagem investigativa novos conceitos que dão significado ao seu existir, oportunizando a toda comunidade de aprendizagem novas possibilidades de ação.
Dentro do processo de ensino e aprendizagem, o “erro” possui o seu valor didático pedagógico, onde o sujeito da aprendizagem constrói as suas representações, que dentro de sua logicidade, possui verdadeiro sentido, que podem ser melhoradas com a ajuda do olhar da comunidade, incorporando novas ideias, transformando o já pensado em reflexão, alcançando um nível superior de conhecimento.
A intervenção pedagógica deve atentar-se ao que denominamos idade cognitiva do aprendente, ao que compete o amadurecimento da compreensão dos alunos durante os estudos de fórmulas e conceitos. Deve-se ainda, levar em consideração, os conhecimentos que se apresentam em forma de senso comum pelos alunos, mas que podem ser lapidados pela comunidade, oferecendo o professor uma contribuição construtiva.

Estas são algumas pistas para alcançarmos o conhecimento dentro da comunidade de aprendizagem investigativa, onde o conhecer não é decorar fórmulas e regras matemáticas ou gramaticais. Para alcançar o conhecimento, o sujeito que o busca passa por um processo de modificação, aceitabilidade, reorganização, plasticidade e construção no que diz respeito à assimilação e interpretação de conteúdos estudados.
A assimilação e interpretação de conteúdos, além de serem apropriações culturais e sociais, são propriedades do sujeito, portanto o sentido obtido do conhecimento é ainda subjetivo, fazendo do sujeito co-reponsável e co-autor de seu processo formativo.

O conhecimento subjetivo é de estrema importância na perspectiva da aprendizagem, pois implica no simbolismo que é dado pelo aluno á parcela da realidade estudada, juntando com a percepção simbólica de toda a comunidade e fazendo relações entre a teoria e a prática.

Dentro desta perspectiva compreendemos a participação do professor como parte da comunidade de aprendizagem investigativa, mediador de conhecimentos, aquele que se ocupa como facilitador na aprendizagem, transformador e ressignificador de conceitos. Os conceitos são ferramentas que desenvolvem nos educandos habilidades de raciocínio que os levam a pensar com uma melhor qualidade e clareza, direcionando-os para um pensamento com excelência.


Assessor filosófico-pedagógio S.E.R.

domingo, março 27

O Labirinto Sagrado

O LABIRINTO SAGRADO:
Ensaios sobre religião, psique e cultura. 
Novo livro do Prof. Pe. Marcial Maçaneiro, SCJ. - Paulus Editora


“O labirinto sagrado” nos possibilita sondar o fascinante mundo da experiência religiosa: decifra antigas hierofanias; descreve a dança de eros no jardim da mística; acolhe o sentido transcendente da Natureza; indaga sobre a relação entre religião e cultura da paz; reivindica a ternura como força transformadora do humano.

Nos oito ensaios temáticos (ordenados como coletânea) o autor tece um diálogo entre subjetividade e história, psique e cultura.

Plural de um lado, coesa de outro, a abordagem tem sensibilidade antropológica e respeito pelo dado religioso.

Em suas linhas conclusivas, elementos de fenomenologia religiosa propiciam o discernimento de novas perspectivas da espiritualidade cristã, aproximando Ciência da Religião e Teologia Espiritual. Afinal, uma e outra se cruzam no labirinto que somos nós, ora atraídas pela gravidade do centro, ora dispostas a sair e irradiar.

Conteúdos da obra:
Primeira Parte – Coordenadas Globais

  • Vivências originárias e senso do Sagrado
  • Hierofania, tempo e ritualidade
  • A água nas religiões: sacralidade e regeneração
  • Religiões e cultura da paz

Segunda Parte – Perspectivas Cristãs

  • A sacralidade interior e seus arquétipos
  • Eros, pessoa e ternura
  • Espiritualidade e paradigmas atuais
  • A “poética” do Evangelho

Religiões e Ecologia



“Ao lado da Ciência, da Educação e dos Governos, também as Religiões participam da tarefa ecológica, em benefício da vida na Terra. O diálogo entre Religiões e Ecologia é tão urgente quanto promissor: estabelece contatos, partilha valores, indica convergências e abre vias de ação conjunta” – assim se expressa o Prof. Pe. Marcial Maçaneiro, vice-diretor da Faculdade Dehoniana, ao apresentar seu livro Religiões & Ecologia (Paulinas, 2011).

Ao longo dos séculos as Religiões traçaram “desenhos do mundo” e indagaram sobre o sentido do universo, propondo virtudes ecológicas como o cuidado, a partilha e a sobriedade no uso dos bens da natureza. É o que verificamos no Hinduísmo, Budismo, Culto dos Orixás, Judaísmo, Cristianismo e Islã – abordados didaticamente nesta obra.

Tendo presente essas seis religiões, o livro se organiza em três partes, cada qual a partir de uma pergunta:

Parte I – Como as religiões interpretam o cosmos e a natureza?
Aqui se esclarece a cosmovisão de cada uma das seis religiões (Hinduísmo, Budismo, Candomblé, Judaísmo, Cristianismo e Islã) É a parte mais longa, por conta dos conteúdos milenares e das muitas narrativas religiosas sobre o mundo, a natureza e a humanidade. O leitor poderá seguir página por página, ou selecionar aquela religião que lhe for de interesse.

Parte II – O que as religiões oferecem para o saber e o agir ecológicos?
Trata dos valores ecológicos presentes nas religiões. Em tom propositivo, destacam-se sete contribuições das religiões para o saber e o agir ecológicos: episteme, profundidade, reconhecimento, virtudes, humanidade, engajamento e espiritualidade. Informações científicas e religiosas se articulam, com distinções e complementos significativos, numa linguagem descritiva e poética, além da explicação conceitual.

Parte III – Que tarefas a ecologia solicita das religiões?
Propõe as tarefas ecológicas que as religiões são chamadas a realizar, como parcela de sua responsabilidade pela vida humana e planetária. As tarefas são condensadas em sete: interpretar a condição humana na Terra; desenvolver a consciência ecológica de seus membros; participar da elaboração de uma epistemologia ambiental; promover a ética ecológica; dialogar sobre questões ambientais; agir conjuntamente pela causa ecológica; reencantar a natureza.

A obra tem conteúdo informativo, fruto de longa pesquisa. A leitura proporciona um contato direto com as fontes religiosas: mitologias, narrativas ancestrais, compêndios doutrinais e textos sacros. O autor inclui o debate atual sobre Ciência Ecológica, com os cientistas Edgar Morin, Enrique Leff, Pierre Dansereau, Alfredo Pena-Vega e James Lovelock. Também documentos internacionais entram na abordagem, como: Convenção da TerraDeclaração sobre o ethos mundial e diretrizes ecumênicas.

Assim, o encontro entre Religiões e Ecologia começa na cosmovisão, passa pelos valores e se projeta num conjunto de tarefas em prol da vida e da sustentabilidade do planeta.

Se conseguimos sonhar também conseguimos realizar os nossos sonhos!


E assim, depois de muito esperar, num dia como outro qualquer, decidi triunfar...
Decidi não esperar as oportunidades e sim, eu mesmo buscá-las.
Decidi ver cada problema como uma oportunidade de encontrar uma solução.
Decidi ver cada deserto como uma possibilidade de encontrar um oásis.
Decidi ver cada noite como um mistério a resolver.
Decidi ver cada dia como uma nova oportunidade de ser feliz.
Naquele dia descobri que meu único rival não era mais que minhas próprias limitações e que enfrentá-las era a única e melhor forma de as superar.
Naquele dia, descobri que eu não era o melhor e que talvez eu nunca tivesse sido.
Deixei de me importar com quem ganha ou perde.
Agora me importa simplesmente saber melhor o que fazer.
Aprendi que o difícil não é chegar lá em cima, e sim deixar de subir.
Aprendi que o melhor triunfo é poder chamar alguém de"amigo".
Descobri que o amor é mais que um simples estado de enamoramento, "o amor é uma filosofia de vida". 
Naquele dia, deixei de ser um reflexo dos meus escassos triunfos passados e passei a ser uma tênue luz no presente. 
Aprendi que de nada serve ser luz se não iluminar o caminho dos demais.
Naquele dia, decidi trocar tantas coisas...
Naquele dia, aprendi que os sonhos existem para tornar-se realidade.
E desde aquele dia já não durmo para descansar... simplesmente durmo para sonhar.
Walt Disney

sexta-feira, março 25

ROBINSON CRUSOÉ - 1º ano do Ensino Médio - Sociologia

Autor: Daniel Defoe nasceu na Inglaterra, em 1660, filho de burgueses de origem holandesa. Educado como protestante e dotado de grande espírito crítico, escrevia e distribuía panfletos criti­cando o rei católico Jaime II e, posteriormente, a rainha Ana, que procurou renovar a Igreja anglicana. Por essa razão, foi preso duas vezes. Em sua vida, viajou a Portugal e à Espanha, onde aprendeu sobre a vida nas colônias portuguesas e espanholas na América. Escreveu também O capitão Singleton, O coronel Jack, Roxana, O capitão Carleton e a obra-prima As aventuras e desventuras de Mol! Flanders. Obra: escrita em 1719, Robinson Crusoé é a obra que o tornou famoso. O romance foi inspirado na história verídica de um marinheiro escocês, que por quatro anos viveu isolado na ilha de Juan Fernandez, no Caribe. O livro conta a vida do jovem inglês Robinson Kreutznaer, logo conhecido como Robinson Crusoé. Tendo gosto por aventuras, torna-se marinheiro e experimenta toda sorte de peripécias, chegando inclusive a viver por algum tempo no Brasil. Em uma expedição malsucedida rumo à África, o navio em que viajava encalha e o bote salva-vidas naufraga com todos a bordo. Crusoé é o único sobrevivente e passa a viver sozinho em uma ilha desabitada, utilizando apenas os recursos que consegue salvar dos destroços do navio encalhado e sua própria engenhosidade em produzir as ferramentas e os utensílios necessários para a sua sobrevivência durante os anos em que vive na ilha.

"Andei sem rumo pela costa, pensando nos meus amigos, todos desaparecidos, com certeza mortos. O mar transformara-se em túmulo, além de carrasco. Longe, mar adentro, o navio continuava imóvel, encalhado. Eu estava molhado, sem água e sem comida. Nos bolsos, apenas uma faca, um cachimbo e um pouco de tabaco. A noite avizinhava-se. Afastada da praia, encontrei uma pequena fonte de água doce. Matei a sede. Para enganar a fome, masquei um naco de fumo. Sem abrigo, sem armas e com medo de feras selvagens, subi numa árvore para passar a noite. Consegui encaixar o corpo cansado no meio de grossos galhos, sem perigo de cair durante o sono. Adormeci logo. (p. 23) [ ... ] O navio, trazido pela tempestade, havia se deslocado para um ponto bem próximo à praia.
Continuava inteiro, sinal de que, se tivéssemos permanecido a bordo, estaríamos agora todos com vida. (p. 23) [ ... ] Em primeiro lugar salvei os animais domésticos que viajavam no navio: um cachorro e quatro gatos. (p. 24) [ ... ] Rapidamente fiz uma revista geral para ver o que podia salvar da carga. [ ... ] Já havia decidido trazer do navio todas as coisas possíveis de serem transportadas. Sabia não ter muito tempo: a primeira tempestade faria o barco em pedaços. (p. 25) [ ... ] Ia para bordo a nado e voltava sempre com uma nova jangada, aproveitando para salvar assim também o madeirame do navio. Consegui desse modo valiosas "riquezas" para um náufrago: machados, sacos de pregos, cordas, pedaços de pano encerado para vela, três pés-de-cabra, duas barricas! com balas de mosquete2, sete mosquetes, mais outra espingarda de atirar chumbo, uma caixa cheia de munições, o barril de pólvora molhada, roupas, uma rede, colchões e - surpresa! - na quinta ou sexta viagem, quando já acreditava não haver mais provisões a bordo, encontrei uma grande reserva de pão, três barris de rum e aguardentes, uma caixa de açúcar e um toneP de boa farinha ... (p. 25-26) [ ... ]
Meu futuro não parecia tão bom ... Na verdade prometia ser triste, com poucas esperanças de salvação. Sozinho, abandonado numa ilha deserta, desconhecida e fora das rotas de comércio, não alimentava a menor perspectiva de sair dali com vida. Já me via velho e cansado, passando fome, sem forças para nada: morreria aos poucos. Isto se eu não morresse antes, vítima de alguma tragédia.
Muitas vezes deixei-me levar pelo desânimo. Não foram poucas as lágrimas que salgaram meu rosto. Nessas ocasiões, recriminava e maldizia a Deus. Como podia ele arruinar suas criaturas de modo tão mesquinho, tornando-as miseráveis, deixando-as ao completo abandono? (p. 29) [ ... ]
Depois de dez dias, fiquei com medo de perder a noção do tempo. Improvisei um rústico, mas eficiente calendário. [ ... ] Todos os dias, riscava no poste um pequeno traço. De sete em sete dias, fazia um risco maior para indicar o domingo. Para marcar o final do mês, eu traçava uma linha com o dobro do tamanho. Dessa forma, podia acompanhar o desenrolar dos dias, conseguindo situar-me no tempo.
Entre tantos objetos, havia trazido do navio tinta, papel e penas para escrever. E, enquanto a tinta durou, mantive um diário, relatando de forma resumida os principais fatos acontecidos. (p. 30) [ ... ] A falta de ferramentas adequadas tornava alguns serviços extremamente demorados. Mas, afinal, para que pressa? Eu não tinha todo o tempo do mundo? [ ... ] Também descobri que o homem pode dominar qualquer profissão que queira ... Aos poucos, tratei de deixar mais confortável o meu jeito de viver. (p. 31) [ ... ]
Foi nessa época que fiquei doente, com febre, e tive alucinações. Vendo a morte muito próxima, fui incapaz de ordenar minhas ideias e colocá-Ias com clareza no papel. Hoje sei que esse período foi um dos piores da minha vida. A febre veio de mansinho. (p. 36) [ ... ] Num momento de lucidez, entre um ataque e outro de febre, lembrei-me de que, no Brasil, se usava fumo para curar a malária. E eu tinha, num dos caixotes, um pedaço de fumo em rolo e algumas folhas ainda não defumadas. Foi a mão de Deus que me guiou. Buscando o fumo, achei uma Bíblia, guardada no mesmo lugar.
O fumo curou-me a febre: não sabia como usá-lo, por isso tentei diversos métodos ao mesmo tempo. Masquei folhas verdes, tomei uma infusão de fumo em corda com rum, aspirei a fumaça de folhas queimadas no fogo. Não sei qual dos métodos deu resultado: talvez todos juntos. A verdade é que sarei em pouco tempo. A Bíblia foi um bom remédio para a alma. (p. 37) [ ... ]
Sempre quis conhecer a ilha inteira, ver cada detalhe dos meus domínios. Acreditei que tinha chegado a hora. Peguei minha arma, uma machadinha, uma quantidade grande de pólvora e mu­nições, uma porção razoável de comida e pus-me a caminho, acompanhado de meu cão ... (p. 42) [ ... ] Na volta, apanhei um filhote de papagaio. Os colonos brasileiros costumavam domesticá-los e en­siná-los a falar. Pensei em seguir-lhes o exemplo. (p. 43) [ ... ]
Foi no início da estação das chuvas. Passando perto da paliçada4, num canto em que o rochedo projetava sua sombra, meus olhos fixaram-se em pequenos brotos germinando. Nunca tinha visto aquelas plantinhas ali. Curioso, aproximei-me a acreditei estar presenciando um milagre: uma ou duas dúzias de pezinhos de milho surgiam da terra. Era milho e da melhor espécie, não havia dúvida. (p. 32) [ ... ] Reconhecido, agradeci à Divina Providência por mais esse cuidado. Só passado algum tempo é que me lembrei de um fato acontecido dias antes. Precisava de algo para guardar restos de pólvora. Procurando no depósito da caverna, achei um velho saco de estopa. Pelos vestígios, no passado servira para armazenar grãos: no seu fundo havia cascas e migalhas de cereais. Para limpar o saco, sacudi esses restos num canto, perto da cerca: milagrosamente haviam germinado! (p. 33) [ ... ]
Precisava de algo para moer o milho e transformá-lo em farinha. Sem instrumentos para fazer um pilão de uma pedra, fiz um de madeira, usando a mesma técnica que os índios brasileiros empregavam na confecção de suas canoas: queimavam a madeira, escavando-a, a seguir, com a plainaS. [ ... ]
Poll, meu papagaio, aprendera a falar e acompanhava-me aonde quer que eu fosse. Fazia-me bem ouvir outra voz além da minha: pena não ser de algum homem." (p. 54)
(DEFOE, Daniel. Robinson Crusoé - A conquista do mundo numa ilha. Adaptação em português de Werner Zotz. São Paulo: Scipione, 1986. Série Reencontro. )

1-Pequeno recipiente de madeira,destinadaa armazenar mercadorias
2-Antiga arma de fogo,parecida com uma espeingarda.
3-Grande recipinete de madeira formado por dois tampos planos e tábuas encurvadas unidas por aros metálicos,
4-Cerca feita com estacas apontadas e fincadas na terra.
5-Ferramenta manual para aplainar,desbastar,facear e alisar madeiras(p46)

quinta-feira, março 24

A importância da Filosofia para a formação do pensamento dos alunos do Ensino Fundamental: Formação – Educação - Humanização

 Profª. Ms. Sônia Siquelli



Final da primeira década do século XXI, sociedade humana, sociedade da técnica bem elaborada, sociedade marcada pelas desigualdades sociais, políticas e econômicas. Marcada pelas preocupações planetárias da possibilidade (in) certa da continuidade de sua existência. Uma sociedade “manca” de seus passos. Evoluiu-se muito na técnica e muito pouco na sua condição humana. Somos capazes, através da Ciência, de conhecermos o universo fora do planeta, mas ao mesmo tempo somos incapazes de convivermos em grupos, de dialogarmos com o outro, de resolvermos os problemas humanos a partir de referências humanas.


Para abordar a importância da Filosofia, enquanto conteúdo e forma de ensino na formação de crianças e adolescentes do ensino fundamental partiremos do seguinte questionamento: Ensinar Filosofia para quê? E, por quê? Para isso façamos a seguinte reflexão a partir da conhecida tese de Heráclito de Éfeso, “Ninguém banha-se duas vezes no mesmo rio”. Segundo esse filósofo ninguém na segunda vez, nem a pessoa nem o rio serão os mesmos. As águas passam, a pessoa muda e, ao banhar-se novamente no mesmo rio, trata-se de uma outra pessoa em novas águas. Nada é para sempre e tudo se transforma. Nós imprimimos uma mudança ao rio e o mesmo nos traz também novas realidades. Assim é a vida biológica, emocional, orgânica e social de todos os seres humanos na elaboração de sua história, condicionamento pelo tempo.


Heidegger, filósofo alemão do século XX, em uma de suas obras faz uso de uma alegoria para explicar a origem do Ser e do Tempo, coloca o homem como fruto da Terra, do Céu e dos Cuidados, tendo como mediador desta existência o Tempo. Nessa alegoria há um embate entre Céu e Terra, sobre a existência humana, mas segue a interpretação de que o homem na sua condição material é fruto da Terra, na sua condição espiritual é fruto do Céu e, durante seu processo de vida precisa de Cuidados. Quando este homem morre seu corpo volta a Terra, a alma ao Céu e quem sustenta todo esse processo é o Tempo.


Para a compreensão da nossa existência pautamo-nos em modelos, paradigmas que nos revele a Verdade sobre nossa existência e a existência do mundo. Do modelo racional e contemplativo grego, ao modelo racional e dogmático medieval, ao modelo experimental da Modernidade acerca de seus conhecimentos acumulados ao longo da história até o paradigma contemporâneo da linguagem, percebemos que a existência humana, a história da sua humanidade se constrói no seio da cultura pelo processo educacional.


Há nesses modelos de interpretação da realidade aqueles que são pautados na essência do homem, no primado racional de que a resposta dos problemas humanos está no próprio conhecimento que o homem possui e acumulou. Em outro, essa resposta se encontra na interação do homem com sua realidade, na sua condição existencialista. Enfim, no embate cultural da produção de conhecimento atual percebe-se em muitas culturas o retorno à tradição, em outras o vislumbramento do novo, da inovação, da Ciência, da Religião, da Arte, da Filosofia e do próprio Senso Comum, lugar da maioria da sociedade humana. Na prática social, há modelos que buscam no econômico a justificativa do fetiche humano como mercadoria da sociedade capitalista e neoliberal.


Enfim, não há um consenso na sociedade humana atual sobre sua própria existência. Não há um consenso sobre a natureza humana e nem dos valores que permeiam essa existência. Podemos pensar que se perdeu algo ao longo da História ou preferimos pensar que é chegada à hora, diante do “caos” instalado nas relações humanas, de forjar valores sociais, políticos, econômicos e, principalmente humanos para conduzir esse Homem à significação de sua existência e da sua continuidade.
Mas, por onde começar? Uma das possibilidades reais é pela Educação desta sociedade. Entendemos e acreditamos que o ensino de Filosofia desde a mais tenra idade, no ensino fundamental, vem contribuir para a formação dessa criança, desse adolescente e jovem que ao ser educado para conhecer e refletir sobre conhecimentos filosóficos irá forjar sua identidade no seu agir ético, enquanto Ser Adolescente, enquanto Ser Social e na constituição enquanto Ser Humano
Essa verdade filosófica pode parecer utópica nessa sociedade atual onde somos valorizados pelo que Temos e não pelo que Somos, mas com certeza é uma verdade que clama por uma atenção formativa por parte das instituições escolares. A prática escolar, a prática educativa e, consequentemente, a prática humana posta na vivência do cotidiano da formação das crianças e adolescentes do ensino fundamental, como forma de contribuição pessoal a cada aluno na sua busca de realização e de felicidade.

1 Mestre e Doutoranda pela Universidade Federal de São Carlos-UFSCar. Professora de Filosofia do 6º ao 9º ano do Colégio Experimental Integrado, docente de Filosofia e História da Educação do Centro Universitário da Fundação de Ensino Octávio Bastos em São João da Boa Vista e da Fundação Euclides da Cunha de São José do Rio Pardo

quarta-feira, março 23

Cura do Medo da Morte... (Ibn Sina)


EM NOME DE DEUS, O CLEMENTE , O MISERICORDIOSO
A CURA DO MEDO  DA MORTE E O TRATAMENTO DO MAL DA AFLIÇÃO ADVENIENTE  DA MESMA,  DO  AI-SHAIKH  AL-RAÍS[1]


Tradução direta do árabe por Jamil Ibrahim Iskandar[2]

Louvado seja Deus, Senhor dos mundos, que suas bendições sejam sobre o nosso Senhor Muhammad[3] e  seus familiares, os agradáveis, os castos.

Sendo o medo da morte um dos mais vigorosos que acompanha o homem e sendo este medo geral e, em sua generalidade, o mais forte e severo de todos os medos, é necessário que eu diga que o medo da morte não se apresenta a não ser para quem, na verdade, não sabe o que é a morte ou não tem ciência para onde irá sua alma  ou porque presume que se sofrer dissolução ou sua constituição se aniquilar, estaria, então, dissolvida sua essência e sua alma estaria aniquilada; uma aniquilação igual a do não-ser, presumindo que o mundo permanecerá, estando ele presente ou não, porque ignora a questão da permanência da alma e o modo do retorno da mesma ou  porque  presume que há forte sofrimento na morte, diferente do sofrimento pelas doenças que talvez o tenham acometido e foram a causa de sua aniquilação ou porque acredita que suas punições se apossarão dele após a morte ou porque está atônito, não sabe para  onde  irá  após a morte ou porque lamenta por aquilo que deixará em riqueza e posses. Tudo isto são presunções falsas, não têm veracidade.
Quanto à ignorância a respeito da morte e não saber o que ela é, esclarecerei que a morte não é senão a alma deixar de utilizar seus instrumentos, que são os órgãos cuja soma chama-se corpo, tal como um artesão abandona seus instrumentos.
A alma é uma substância não corpórea, não está sujeita e nem é receptiva à corrupção. Este esclarecimento necessita de conhecimentos que o antecedem. Isto está esclarecido e explicado em seu devido lugar[4].  Se esta substância abandonar o corpo, ela permanece e esta permanência lhe é própria, isenta das moléstias da natureza , feliz,   cuja felicidade é completa; não havendo meio para seu aniquilamento e para sua não existência. A substância não se aniquila enquanto é substância; sua essência não se aniquila, entretanto os acidentes, as particularidades, as relações e as correlações que existem entre a mesma e os corpos se anulam por intermédio de seus contrários. Quanto à substância, ela não tem contrário; cada coisa que se corrompe, se corrompe por seu contrário. Se você observar a substância corpórea, que é mais vil do que a substância nobre, a encontrará não sujeita à aniquilação e à destruição enquanto substância, mas  uma substância em relação à outra modifica-se. Deste modo, rejeita-se alguma coisa própria da substância e rejeita-se seus acidentes.
Quanto à própria substância, ela permanece e não há meio para sua não existência e seu aniquilamento. A substância espiritual[5]  não aceita transformação nem alteração em sua essência, aceita , porém,  a completude e as perfeições de sua forma.  Como então imaginar nela o não-ser e a destruição?
Quem tem medo da morte porque não tem ciência para onde irá sua alma ou porque presume que se seu corpo sofrer dissolução e sua constituição aniquilar-se, se aniquilariam tanto sua essência como sua alma e, além disso, ignorando a permanência da alma e a qualidade do retorno[6], então, na verdade, não tem medo da morte mas, ignora o que é necessário saber. A ignorância é o medo e a causa do medo  da morte,  e esta ignorância é o que levou os sábios a desejarem o conhecimento e a dedicação em função deste, bem como a abandonarem os prazeres do corpo e o repouso do mesmo, optando pela aplicação e pela vigília. Perceberam que o descanso de se libertar da ignorância é o verdadeiro descanso e o verdadeiro cansaço é o cansaço da ignorância porque esta é uma enfermidade que está na alma e eximir-se dela é libertação e descanso duradouro e prazer eterno.
Quando os sábios creram nisso, refletiram e procuraram a verdade a respeito ,  alcançando  a mesma pelo intelecto e, assim, obtendo tranqüilidade, todas as questões terrenas ficaram simples para eles. Vilipendiaram tudo que as pessoas em geral consideram importante, como dinheiro e riqueza, os prazeres sensíveis e os desejos que levam a estes prazeres. Se os desejos forem de pouca afirmação  e permanência, rapidamente perecem e desaparecem; trazem muitas preocupações quando existem e imensas aflições quando não existem, então os filósofos os evitaram na medida do necessário na vida e se consolaram com o mérito de viver nesta vida sem os vícios que mencionei e não mencionei também, porque estes não levam a um objetivo. Pois, se o ser humano alcançar um propósito nesta vida, é levado a outro propósito, sem limite nem término num limite. Esta é a morte da qual não se deve ter medo, e o empenho pela mesma[7]  é o empenho pelo efêmero, dedicar-se a ela é dedicar-se ao fútil; por isso, segundo o juízo dos filósofos, a morte são duas mortes. Uma voluntária e outra natural. Também, a vida são duas vidas: uma vida voluntária e outra natural - quiseram significar por morte voluntária, a morte da concupiscência e o abandono da exposição a ela e quiseram significar por vida voluntária aquilo em função do qual o homem se esforça na vida terrena no que diz respeito a alimentos, a bebidas e à concupiscência e quiseram significar por vida natural, a permanência da alma, duradoura na felicidade eterna pelo que adquire de benefício através do conhecimento e isenção da ignorância – por isso o filósofo[8]  Plotino, que Deus conceda o descanso à sua tumba, que perquiriu a sabedoria; recomendou e disse: “morra voluntariamente, viverás naturalmente”.        As  pessoas que têm medo da morte natural, têm medo do que é necessário suplicar, porque a pessoa é um “vivente racional, mortal”. Então, a morte é perfeição e completude e por ela atinge-se o mais alto grau de entendimento. Quem souber que toda coisa é composta por sua própria definição e sua definição é composta por seu gênero e suas diferenças (específicas) e que o gênero da pessoa é o vivente e  suas diferenças são as coisas racionais e as mortais,  sabe que depende de seu gênero e de suas diferenças porque todo composto, sem dúvida, depende da coisa a partir da qual foi composto. Quem ignorar aquilo do qual  está  tendo medo a perfeição de sua essência  e qual é a pior situação,  quem estimar que sua própria aniquilação se dá através de sua vida e sua imperfeição se dá através de sua perfeição, e, ainda,  se o imperfeito tiver medo de se aperfeiçoar,  ignora a si mesmo no máximo  da ignorância. Então, é dever daquele que compreende, entristecer-se com a imperfeição e ser afável com a perfeição, procurar tudo que o aperfeiçoa,  o completa e o dignifica e eleva sua situação. Deve desvincular-se do aspecto que acredita levá-lo ao medo e  não se desvincular do aspecto  que fortalece sua certeza e o acrescenta quanto à sua constituição  e ao seu comprometimento. Assim, terá certeza  que se a substância  divina, nobre, ficar livre da substância corpórea grosseira, porém, uma libertação pura e sincera e não uma libertação mesclada e obscura, então atingirá o mundo mais elevado  e retornará à Sua soberania e se aproximará de seu Criador;  passará para a proteção do Senhor dos mundos e estará na companhia dos espíritos agradáveis, parecidos e semelhantes a ele e ficará salvo de seus opostos e seus diferentes.
A partir disto,  sabemos  que aquele  cuja  alma separar-se de seu corpo porém, desejosa do corpo,  compadecida, temendo a separação  deste corpo, esta alma está no máximo do infortúnio e da dor em sua essência, e sua substância se distancia do aspecto de sua permanência, desejando a sua própria permanência para   estabelecer-se nela.
Quanto a quem presume que a morte é uma dor terrível, diferente da dor das enfermidades que talvez tenham  se lhe apresentado, sua presunção é falsa porque a dor se dá por apreensão e a apreensão pertence ao vivente e  o vivente é  quem recebe a influência da alma. O corpo que não tem influência da alma, não sente dor e nem tem sentidos[9]. Então, na morte, que é a separação da alma do corpo, não há dor porque o corpo só  sente dor e tem sensação por intermédio da alma e a concretização da influência da mesma no corpo; se se tornar apenas corpo, não haverá  influência sobre a alma, não haverá sentidos nem dor.
Ficou esclarecido, então, que a morte é uma situação para o corpo que se dá pela separação da alma deste corpo, a morte não será sentida nem traz dor, porque havia sensação e dor por intermédio da alma. Quanto a quem tem medo da morte por causa da sanção, então, na realidade, não tem medo da morte, mas tem medo da sanção; a  sanção  se dá sobre alguma coisa que permanece após a morte; então, sem dúvida ,  este reconhece suas culpas e suas  ações más,  merecedoras de punição. Com isto, reconhece um legislador justo que sanciona  pelas coisas más e não pelas boas ações. Portanto, quem tem medo da morte, tem medo de seus pecados e não da morte. Quem tem medo de seus pecados lhe é   um dever evitar esses pecados. As más ações  chamam-se  pecados e procedem de disposições más;    ‘mencionamos e lembramos seus contrários, ou seja, as virtudes’. Quem tem medo da morte sob esta forma e este aspecto, então ignora aquilo do que deve ter medo e tem medo daquilo que não exerce influência nem medo. Quem adquirir conhecimento, se afirma e quem se afirmar conhecerá a via da felicidade e, então, seguirá esta via. Quem  segue o caminho da retidão visando a um objetivo, será , sem dúvida,  conduzido a este objetivo. A afirmação que acontece por intermédio do conhecimento, é a certeza e a situação daquele que reflete sobre sua religião e está apegado à sabedoria da mesma.
Quem  diz não ter medo da morte mas se entristece por deixar família, filho e riqueza e lamenta o que perderá de  deleites e concupiscências do mundo, é necessário mostrar-lhe que o entristecer-se por algo que é imprescindível que aconteça, não há esforço útil por este algo. O ser humano está entre os vários elementos  que existem por geração, engendrados corruptíveis. Todo  ser engendrado, sem dúvida,  é corruptível. Quem almeja não ser corruptível, então almeja não existir e quem almeja não existir almeja a corrupção de si próprio; é como  se almejasse ser corruptível e almejasse não ser corruptível , almeja existir e não existir. Isto é impossível, não ocorre a quem intelige. Também, se fosse possível ao ser humano permanecer[10], os nossos antecedentes teriam permanecido. Se todas as pessoas permanecessem com suas descendências e não morressem, a Terra não os comportaria. Você pode refletir sobre isto que estamos dizendo.
Foi estimado que um só homem que existisse desde há 400 anos até hoje e pertencendo a pessoas famosas, para que seja possível fazer o censo de seus filhos existentes, como por exemplo o Príncipe  dos Crentes  ‘Ali Ben  Abi  Tálib[11],  que a paz recaia sobre ele,  que tem filhos e seus filhos também têm filhos e permanecessem  também gerando filhos e ninguém deles morresse. Calcule a quantidade  dos mesmos em nosso tempo e encontrarás mais do que dez mil homens; calcule também todos os que  viveram neste século[12] na superfície da Terra, tanto no Oriente como no Ocidente da mesma. Se duplicar este número, não haverá uma multiplicidade[13]  que os abranja nem uma quantidade que os conte. Calcule a superfície da Terra. É  uma superfície conhecida e limitada. A Terra não os comportaria nem em pé nem amontoados, como então os comportaria sentados à vontade? Não restará lugar para construção nem lugar para o plantio nem trânsito para alguém nem  haverá um movimento mais prioritário que outro. Tudo isto  considerando  um tempo pequeno. Como seria então se se aumentar o tempo considerado e as pessoas duplicarem nesta proporção?
Esta é a situação de quem sente concupiscência   pela vida eterna e tem aversão pela morte e estima que isto seja  possível[14], em função da ignorância e de nada  entender a respeito.  Então,  a sabedoria Divina eloqüente e a justiça ampla do governo imparcial, é Retidão que não tem ninguém  justo superior a  Ele. Ele é o máximo da generosidade e não tem  propósito de vantagem.  Aquele que tem medo da morte, tem medo da justiça de Deus e de Sua sabedoria, tem medo de Sua generosidade e de Sua doação. Portanto, a morte não é perniciosa, pernicioso é o medo da  mesma. Quem tem medo da morte ignora-a e ignora a essência da mesma.
A verdade sobre a morte é a separação da  alma do corpo. Nesta separação não há corrupção da alma, é corrupção da composição do corpo. A substância da alma  que é a essência do ser humano e sua parte mais importante e, também, sua redenção, permanece e não é corpórea. Acompanha-a o que acompanha os corpos, porém, nada de acidentes dos corpos a acompanha, tais como, a competitividade quanto a lugar porque não necessita de  lugar e não se empenha quanto à permanência temporal porque prescinde do tempo.  Mas o benefício desta substância através dos sentidos e dos corpos é completude para a mesma. Se se completar por intermédio destes[15] e depois  desvincular-se dos mesmos, dirige-se para o seu mundo[16] nobre, próximo de seu Criador e de sua procedência, Querido e  Excelso seja.
O homem que pratica uma caridade por seu irmão falecido ou supre uma  dívida do mesmo, fica feliz pela felicidade deste falecido –  porque se a alma for una, o próprio praticante da caridade,  e esta outra alma e as outras almas são uma só coisa mas, se esta alma for múltipla[17], o caridoso somente praticará esta amabilidade por esta alma em função de sua  semelhança a ela - e essas almas  semelhantes são como se fossem uma só coisa.


Apesar de ter sido defensor do espírito racionalista e científico, Avicena mostra o apreço que tinha por sua religião.

terça-feira, março 22

Núcleo de Pesquisas em Filosofia no Mundo Islâmico Medieval (NUR)


Idealizado pelos professores Jamil Iskandar e Cecilia Cavaleiro de Macedo, o Núcleo de Pesquisas em Filosofia no Mundo Islâmico Medieval (NUR) está sediado na Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP - a primeira universidade brasileira a contar, em seu Curso de Filosofia, com duas cadeiras independentes de Filosofia Medieval Árabe e Filosofia Medieval Judaica.
O núcleo dedica-se a investigar o desenvolvimento do pensamento filosófico medieval sob o domínio islâmico através do estudo das obras de seus maiores expoentes, bem como suas origens e influências sobre a história do pensamento filosófico. Para tanto, conta com três linhas de pesquisa: duas delas contemplam a produção filosófica islâmica e a produção filosófica judaica do período, e uma terceira linha apresenta um espectro mais amplo, sendo dedicada à investigação das fontes destes pensamentos, dos diálogos possíveis com outras correntes filosóficas ou outros ramos do conhecimento, assim como dos desdobramentos posteriores destas importantes contribuições na história do pensamento até os dias atuais.
O trabalho principal do grupo consiste nas pesquisas individuais e compartilhadas dos professores integrantes e na orientação de monografias, trabalhos de iniciação científica e dissertações. Os pesquisadores participantes mantêm também um grupo de estudos presencial na UNIFESP/Campus Guarulhos, em caráter permanente, voltado a temas e obras compreendidos por estas linhas de pesquisa, assim como desenvolvem ações no sentido da divulgação desta área de investigação.
 
Coordenação:
Prof. Dr. Jamil Ibrahim Iskandar
Profa. Dra. Cecilia Cintra Cavaleiro de Macedo

quinta-feira, março 17

Transformando alunos em Cidadãos Reflexivos: Novo Espaço Filosófico Criativo


                  A partir da proposta de utilização da coleção Novo Espaço Filosófico Criativo, o aluno é convidado a ser co-autor do material, juntamente com o (a) professor (a) e a Comunidade de Aprendizagem Investigativa. Ser co-autor é participar do processo de ensino e aprendizagem. Sabemos que o ensino não garante a aprendizagem, porém com o método dinâmico e participativo da co-autoria, o aluno busca respostas para as questões e problemas propostos no material, construindo novos conceitos a partir do que o material lhes apresenta.

O que buscamos como objetivos com as nossas Coleções?
  1. Ensinar a pensar melhor:
Como? Despertando no aluno:
  • o homem de entendimento;
  • o homem de razão;
  • o homem de instrução;
  • o homem que supera sentimentos e desejos instintivos.

  1. Construção da identidade – Sobre nós
Na coleção Novo Espaço filosófico Criativo, os autores Sandra e Silvio, transportam-se para dentro do livro didático, assumindo os personagens Filos e Sofia, fazem uma apresentação de quem são, convidam os alunos a apresentarem-se de forma espontânea, iniciando um processo de conhecimento da comunidade. Acredita-se que ao conhecer-se a si mesmo, é necessario ir ao encontro do conhecimento do outro e do mundo em que vivemos, pois fazemos parte de um todo, somos seres (entes) que precisamos compreender nossos pensamentos e o que os outros pensam sobre nós e nossos comportamentos, para assim melhorarmos nossa conduta perante o mundo.
Alguns Conceitos trabalhados na coleção Novo Espaço Filosófico Criativo de 1º ao 5º ano.
  • Ser autor: criar com autonomia suas ideias;
  • Pertença: fazer parte de um mesmo grupo – idade, sala de aula, ideais,...;
  • Comparação: Grande, pequeno, bom, mau, ...;
  • Gostos: brincadeiras, cores, filmes, jogos, ...;
  • Percepção: desenvolvimento dos sentidos;
  • Preferências: comida, brinquedos, brincadeiras, filmes, desenhos, etc.
  • Medos: do novo, do escuro, ...;
  • Ficar contente: com uma nova amizade, com um novo brinquedo, ...;
  • Diferença entre Casa e lar;
  • Amizade, consideração, colegas, conhecidos;
  • Escola;
  • Construção de Regras;
  • Comunidade de aprendizagem investigativa.
  • Conhecimento e compreensão: Compreender a si mesmo, o que está a nossa volta, o outro e o mundo.
  • Educar para as emoções, paixões, alegrias, infelicidades, crenças, esperanças, perdas, tudo que constitui a essência humana.
O S.E.R. apresenta um método de trabalho que prevê a formação do homem como um todo (Paidéia grega), desde os educadores, pais e professores, oportunizando formações continuadas, presencial e EaD, assessorias filosófico-pedagógicas, Roteiros pedagógicos anuais, Seminários Regionais e Congressos Nacionais. Chegamos aos estudantes através dos materiais didáticos, projeto autor na escola, através de nossos sites www.portalser.netwww.editorasophos.com.br e através das comunidades sociais, Orkut, Facebook e Blog’s.

O programa Educação para o Pensar: Filosofia com crianças adolescentes e jovens, tem a pretenção de desenvolver nos seus participantes, habilidades de raciocínio através de atividades desenvolvidas na Comunidade de Aprendizagem Investigativa. O professor(a) apresenta-se diante da comunidade como o mediador(a) dos conhecimentos, sendo um facilitador(a) do processo para seus alunos(as).

Podemos considerar o programa Educação para o Pensar um método, onde é desenvolvida a disciplina do aprender a pensar bem. É algo que deve ajudar qualquer pessoa a elaborar suas estratégias cognitivas, situando e contextualizando informações e decisões, tornando-a apta a enfrentar os desafios da vida. É um método de aprendizagem que considera o erro e a incerteza humana, levando em consideração o processo e não o produto, sendo estes, parte do desenvolvimento e crescimento no processo de ensino e aprendizagem.

Prof. Geverson Luz Godoy - godoy@portalser.net e
Prof. Luiz Carlos Kons – Luis@portalser.net
Assessores filosófico-pedagógicos S.E.R.

Três passos para a acessibilidade filosófica nas escolas


Ricardo Valim
1

Geralmente quando em sala de aula falamos de filosofia ou da personalidade de um filósofo a primeira imagem que vem a cabeça de um jovem é a de um homem todo descabelado e com umas idéias que mais parecem coisas de maluco do que outra coisa. Na verdade este é um mito – por assim dizer – de tradição oral e, que passa de geração em geração, pelos corredores de nossas escolas. E com isso a filosofia vai ganhando descrédito com os alunos que vêem nestas “idéias de malucos” um “passaporte para o fracasso”. Visto que não achamos por aí um filósofo dono de uma multinacional com uma renda de milhares de cifrões ao ano.
O primeiro passo a ser dado para reverter este processo é tornar a filosofia acessível às crianças. Ou seja, é o ato de trabalhar filosofia e conceitos filosóficos com as crianças na linguagem das crianças. É basicamente a modelagem de uma nova forma detransmissão de temas e teorias de filosofia para as crianças. É preciso salientar que esta nova forma de educar filosoficamente não pretende anular ou fragmentar, abolir as correntes filosóficas que perpassaram os séculos. Mas sim, sem abandonar a tradição filosófica, proporcionar aos alunos uma filosofia que eles possam entender e degustar com facilidade.
Um segundo passo seria deixar as crianças falarem o que sentem e como vêem a filosofia no seu entendimento. Deste modo elas se sentiram importantes dentro de uma discussão e com isso poder-se-á fazer correções e de modo sorrateiro elas aprenderam por si mesmas o valor de sua opinião e como se portar diante de um conflito de idéias. Segundo o filósofo e educador norte americano Matthew Lipman em sua obra “A Filosofia vai à Escola”, não existe melhor método do que o da discussão em sala de aula porque a “... discussão, por sua vez, aguça o raciocínio e as habilidades de investigação das crianças como nenhuma outra coisa pode fazer” (LIPMAN, 1990, pag. 41).
E por ultimo, mas não menos importante é o exemplo do professor na sala de aula. As crianças, como se sabe, têm o habito de imitar os adultos nos seus gestos, palavras e ações. É basicamente uma forma primitiva de ingressar no circulo cultural adulto. Um professor em sala de aula que expõe seus conteúdos de forma clara, objetiva e apaixonada, obviamente os alunos vão se interessar e buscarão aperfeiçoar aqueles conteúdos, por que foram “cativados”. Já o contrário também pode ocorrer. As crianças por natureza são apaixonadas pelo conhecimento e é preciso cultivar, fortalecer esta paixão que brota de sua humilde e terna sinceridade. Diz-nos Lipman, “as crianças só acharam a educação uma aventura irresistível se os professores também a acharem...”.
A educação filosófica deve ser vista e ensinada em nossas escolas não mais como um “passaporte para o fracasso”, mas sim com uma forma criativa de ler e interpretar a realidade e a partir desta leitura transformá-la em um lugar mais humano para se viver. E tudo isso deve começar com as crianças, pois são elas o futuro da humanidade mais esclarecida que queremos para o nosso futuro.

1 Bacharel em Filosofia pela Faculdade São Luiz de Brusque /SC e Pós Graduando em Metodologia do Ensino de Filosofia e Sociologia pelo Grupo Uniasselvi Assevim de Brusque/ SC

sábado, março 12

Estadistas globais – Artigo J. O Globo 12/03/2011



Com o fim da guerra fria, os presidentes já não são defensores de ideias e posições estratégicas na geopolítica internacional. A globalização apequenou os dirigentes nacionais em agendas locais, sobretudo comerciais. A globalização ainda não produziu os estadistas globais que o mundo precisa. O estadista global precisa perceber a necessidade de ir além do comércio, deixar de ver as fronteiras de seu país como um problema alfandegário e migratório e entender seu papel na arquitetura do futuro mundial.

O presidente Barack Obama e a presidente Dilma Rousseff estão entre os poucos com condições de olhar para o mundo como estadistas globais, e não apenas como líderes de seus países. Ambos têm biografia comprometida com valores e princípios, com bandeiras de luta. Têm ideias e sentimentos dos problemas mundiais. Além disto, como negro e como mulher, cada um deles tem uma gênese biopolítica diferente dos seus antecessores. O que lhes permite sentimentos e posições novas em relação ao futuro.
Por estas razões, a visita do presidente Obama ao Brasil e seu diálogo com a presidente Dilma nos permitem esperar um fato histórico, e não apenas mais um simpático gesto diplomático. De início já se percebe a grandeza de ambos ao lembrarmos que é a primeira vez que um presidente americano vem ao Brasil, antes de o colega brasileiro ir aos EUA.
Mas para ter uma marca histórica, será necessário que os dois presidentes transformem o encontro em uma reunião de cúpula de dois estadistas globais, definindo agenda comum para os problemas do mundo.
A proliferação de armas de destruição em massa e o terrorismo devem estar entre as principais preocupações desta agenda; aspectos comerciais não podem ser esquecidos, mas os problemas mundiais vão além. Os dois presidentes precisam colocar na agenda pelo menos três outros temas: a luta contra a pobreza, lembrando a fala da presidenta Dilma de que "mundo rico é mundo sem pobreza"; a subordinação da economia ao equilíbrio ecológico; e a defesa dos direitos humanos.

Roosevelt e Truman, já no espírito do estadismo da guerra fria, lançaram o Plano Marshall pela reconstrução da Europa; Kennedy, ainda no espírito da guerra fria, lançou o Alimentos para Paz e diversos programas de apoio ao desenvolvimento econômico de cada país subdesenvolvido. Obama e Dilma devem ir muito além, adaptando-se às exigências do mundo global no século XXI. Não mais unilateralmente vindo dos EUA e não mais apenas de desenvolvimento econômico de cada país. 
 


Cristovam Buarque é Professor da UnB e Senador pelo PDT-DF
Devem juntos lançar as ideias de um plano social global de luta contra a pobreza, sobretudo por sua superação pela educação, com a adoção mundial de programas como o Bolsa Escola e o apoio à escolaridade com qualidade para todas as crianças do mundo. E apresentar linhas de uma Carta a ser submetida aos chefes de estado e de governo na reunião Rio + 20, em 2012. Dilma e Obama têm manifestado preocupações ambientais, especialmente em busca de fontes alternativas de energia, e poderiam levar em conjunto este discurso para o mundo. Assinar uma aliança atualizando o conceito da autodeterminação dos povos para levar em conta o mundo como um condomínio de países com responsabilidades mútuas: com os direitos humanos; contra o terrorismo; impedindo a proliferação de armas de destruição em massa; e permitindo o uso do avanço técnico a serviço de toda a humanidade.

Dilma e Obama representam países fortes e têm qualidades pessoais para transformar um encontro de dois presidentes em uma reunião de cúpula de dois estadistas globais. O Brasil, os EUA e o mundo, nós de hoje e as gerações futuras esperamos que eles aproveitem a oportunidade que a História, a biografia e o mérito de cada um estão nos oferecendo.
 Cristovam Buarque é Professor da UnB e Senador pelo PDT-DF

sexta-feira, março 11

O Valor da Filosofia


Bertrand Russell
Tendo agora chegado ao término de nossa breve e incompletíssima revisão dos problemas da filosofia, será conveniente considerar, para concluir, qual é o valor da filosofia e por que ela deve ser estudada. É da maior importância considerar esta questão, em vista do fato de que muitos homens, sob a influência da ciência e dos negócios práticos, propendem a duvidar se a filosofia é algo melhor que inocente mas inútil passatempo, com distinções sutis e controvérsias sobre questões em que o conhecimento é impossível.

Esta visão da filosofia parece resultar, em parte, de uma concepção errada dos fins da vida humana e em parte de uma concepção errada sobre o tipo de bens que a filosofia empenha-se em buscar. As ciências físicas, por meio de invenções, é útil para inumeráveis pessoas que a ignoram completamente; e por isso o estudo das ciências físicas é recomendável não somente, ou principalmente, por causa dos efeitos sobre os estudantes, mas antes por causa dos efeitos sobre a humanidade em geral. É esta utilidade que faz parte da filosofia. Se o estudo de filosofia tem algum valor para outras pessoas além de para os estudantes de filosofia, deve ser somente indiretamente, através de seus efeitos sobre as vidas daqueles que a estudam. Portanto, é em seus efeitos, se é que ela tem algum, que se deve procurar o valor da filosofia.

Mas, além disso, se não quisermos fracassar em nosso esforço para determinar o valor da filosofia, devemos em primeiro lugar libertar nossas mentes dos preconceitos dos que são incorretamente chamados homens práticos. O homem prático, como esta palavra é freqüentemente usada, é alguém que reconhece apenas necessidades materiais, que acha que o homem deve ter alimento para o corpo, mas se esquece que é necessário prover alimento para o espírito. Se todos os homens estivessem bem; se a pobreza e as enfermidades tivessem já sido reduzidas o mais possível, ainda ficaria muito por fazer para produzir uma sociedade verdadeiramente válida; e até no mundo existente os bens do espírito são pelo menos tão importantes quanto os bens materiais. É exclusivamente entre os bens do espírito que o valor da filosofia deve ser procurado; e somente aqueles que não são indiferentes a esses bens podem persuadir-se de que o estudo da filosofia não é perda de tempo.

A filosofia, como todos os outros estudos, visa em primeiro lugar o conhecimento. O conhecimento que ela tem em vista é o tipo de conhecimento que confere unidade sistemática ao corpo das ciências, bem como o que resulta de um exame crítico dos fundamentos de nossas convicções, de nossos preconceitos, e de nossas crenças. Mas não se pode dizer, no entanto, que a filosofia tenha tido algum grande êxito na sua tentativa de fornecer respostas definitivas a seus problemas. Se perguntarmos a um matemático, a um mineralogia, a um historiador, ou a qualquer outro cientista, que definido corpo de verdades foi estabelecido pela sua ciência, sua resposta durará tanto tempo quanto estivermos dispostos a lhe dar ouvidos. Mas se fizermos essa mesma pergunta a um filósofo, ele terá que confessar, se for sincero, que a filosofia não tem alcançado resultados positivos tais como tem sido alcançados por outras ciências. É verdade que isso se explica, em parte, pelo fato de que, mal se torna possível um conhecimento preciso naquilo que diz respeito a determinado assunto, este assunto deixa de ser chamado de filosofia, e torna-se uma ciência especial. Todo o estudo dos corpos celestes, que hoje pertence à Astronomia, se incluía outrora na filosofia; a grande obra de Newton tem por título: Princípios matemáticos da filosofia natural. De maneira semelhante, o estudo da mente humana, que era uma parte da filosofia, está hoje separado da filosofia e tornou-se a ciência da psicologia. Assim, em grande medida, a incerteza da filosofia é mais aparente do que real: aquelas questões para as quais já se tem respostas positivas vão sendo colocadas nas ciências, ao passo que aquelas para as quais não foi encontrada até o presente nenhuma resposta exata, continuam a constituir esse resíduo a que é chamado de filosofia.

Isto é, no entanto, só uma parte do que é verdade quanto à incerteza da filosofia. Existem muitas questões ainda - e entre elas aquelas que são do mais profundo interesse para a nossa vida espiritual - que, na medida em que podemos ver, deverão permanecer insolúveis para o intelecto humano, a menos que seus poderes se tornem de uma ordem inteiramente diferente daquela que são atualmente. O universo tem alguma unidade de plano e objetivo, ou ele é um concurso fortuito de átomos? É a consciência uma parte permanente do universo, dando-nos esperança de um aumento indefinido da sabedoria, ou ela não passa de transitório acidente sobre um pequeno planeta, onde a vida acabará por se tornar impossível? São o bem e o mal importantes para o universo ou somente para o homem? Tais questões são colocadas pela filosofia, e respondidas de diversas maneiras por vários filósofos. Mas, parece que se as respostas são de algum modo descobertas ou não, nenhuma das respostas sugeridas pela filosofia pode ser demonstrada como verdadeira. E, no entanto, por fraca que seja a esperança de vir a descobrir uma resposta, é parte do papel da filosofia continuar a examinar tais questões, tornar-nos conscientes da sua importância, examinar todas as suas abordagens, mantendo vivo o interesse especulativo pelo universo, que correríamos o risco de deixar morrer se nos confinássemos aos conhecimentos definitivamente determináveis.

Muitos filósofos, é verdade, sustentaram que a filosofia poderia estabelecer a verdade de certas respostas a tais questões fundamentais. Eles supuseram que o que é mais importante no campo das crenças religiosas pode ser provado como verdadeiro por meio de estritas demonstrações. A fim de julgar tais tentativas, é necessário fazer uma investigação sobre o conhecimento humano, e formar uma opinião quanto a seus métodos e suas limitações. Sobre tais assuntos é insensato nos pronunciarmos dogmaticamente. Porém, se as investigações de nossos capítulos anteriores não nos induziram ao erro, seremos forçados a renunciar à esperança de descobrir provas filosóficas para as crenças religiosas. Portanto, não podemos incluir como parte do valor da filosofia qualquer série de respostas definidas a tais questões. Mais uma vez, portanto, o valor da filosofia não depende de um suposto corpo de conhecimento definitivamente assegurável, que possa ser adquirido por aqueles que a estudam.

O valor da filosofia, na realidade, deve ser buscado, em grande medida, na sua própria incerteza. O homem que não tem umas tintas de filosofia caminha pela vida afora preso a preconceitos derivados do senso comum, das crenças habituais de sua época e do seus país, e das convicções que cresceram no seu espírito sem a cooperação ou o consentimento de uma razão deliberada. Para tal homem o mundo tende a tornar-se finito, definido, óbvio; para ele os objetos habituais não levantam problemas e as possibilidades infamiliares são desdenhosamente rejeitadas. Quando começamos a filosofar, pelo contrário, imediatamente nos damos conta (como vimos nos primeiros capítulos deste livro) de que até as coisas mais ordinárias conduzem a problemas para os quais somente respostas muito incompletas podem ser dadas. A filosofia, apesar de incapaz de nos dizer com certeza qual é a verdadeira resposta para as dúvidas que ela própria levanta, é capaz de sugerir numerosas possibilidades que ampliam nossos pensamentos, livrando-os da tirania do hábito. Desta maneira, embora diminua nosso sentimento de certeza com relação ao que as coisas são, aumenta em muito nosso conhecimento a respeito do que as coisas podem ser; ela remove o dogmatismo um tanto arrogante daqueles que nunca chegaram a empreender viagens nas regiões da dúvida libertadora; e vivifica nosso sentimento de admiração, ao mostrar as coisas familiares num determinado aspecto não familiar.

Além de sua utilidade ao mostrar insuspeitadas possibilidades, a filosofia tem um valor - talvez seu principal valor - por causa da grandeza dos objetos que ela contempla, e da liberdade proveniente da visão rigorosa e pessoal resultante de sua contemplação. A vida do homem reduzido ao instinto encerra-se no círculo de seus interesses particulares; a família e os amigos podem ser incluídos, mas o resto do mundo para ele não conta, exceto na medida em que ele pode ajudar ou impedir o que surge dentro do círculo dos desejos instintivos. Em tal vida existe alguma coisa que é febril e limitada, em comparação com a qual a vida filosófica é serena e livre. Situado em meio de um mundo poderoso e vasto que mais cedo ou mais tarde deverá deitar nosso mundo privado em ruínas, o mundo privado dos interesses instintivos é muito pequeno. A não ser que ampliemos o nosso interesse de maneira a incluir todo o mundo externo, ficaremos como uma guarnição numa praça sitiada, sabendo que o inimigo não a deixará fugir e que a capitulação final é inevitável. Não há paz em tal vida, mas uma luta contínua entre a insistência do desejo e a impotência da vontade. De uma maneira ou de outra, se pretendemos uma vida grande e livre, devemos escapar desta prisão e desta luta.

Uma válvula de escape é pela contemplação filosófica. A contemplação filosófica não divide, em suas investigações mais amplas, o universo em dois campos hostis: amigos e inimigos, aliados e adversários, bons e maus; ela encara o todo imparcialmente. A contemplação filosófica, quando é pura, não visa provar que o restante do universo é semelhante ao homem. Toda aquisição de conhecimento é um alargamento do Eu, mas este alargamento é melhor alcançado quando não é procurado diretamente. Este alargamento é obtido quando o desejo de conhecimento é somente operativo, por um estudo que não deseja previamente que seus objetos tenham este ou aquele caráter, mas adapte o Eu aos caracteres que ele encontra em seus objetos. Esse alargamento do Eu não é obtido quando, tomando o Eu como ele é, tentamos mostrar que o mundo é tão similar a este Eu que seu conhecimento é possível sem qualquer aceitação do que parece estranho. O desejo para provar isto é uma forma de egotismo, é um obstáculo para o crescimento do Eu que ele deseja, e do qual o Eu sabe que é capaz. O egotismo, na especulação filosófica como em tudo o mais, vê o mundo como um meio para seus próprios fins; assim, ele faz do mundo menos caso do que faz do Eu, e o Eu coloca limites para a grandeza de seus bens. Na contemplação, pelo contrário, partimos do não-Eu, e por meio de sua grandeza os limites do Eu são ampliados; através da infinidade do universo, a mente que o contempla participa um pouco da infinidade.

Por esta razão a grandeza da alma não é promovida por aquelas filosofias que assimilam o universo ao Homem. O conhecimento é uma forma de união do Eu com o não-Eu. Como toda união, ela é prejudicada pelo domínio, e, portanto, por qualquer tentativa de forçar o universo em conformidade com o que descobrimos em nós mesmos. Existe uma tendência filosófica muito difundida em relação a visão que nos diz que o Homem é a medida de todas as coisas; que a verdade é construção humana; que espaço e tempo, e o mundo dos universais, são propriedades da mente, e que, se existe alguma coisa que não seja criada pela mente, é algo incognoscível e de nenhuma importância para nós. Esta visão, se nossas discussões precedentes forem corretas, não é verdadeira; mas além de não ser verdadeira, ela tem o efeito de despojar a contemplação filosófica de tudo aquilo que lhe dá valor, visto que ela aprisiona a contemplação do Eu. O que tal visão chama conhecimento não é uma união com o não-Eu, mas uma série de preconceitos, hábitos e desejos, que compõem um impenetrável véu entre nós e o mundo para além de nós. O homem que se compraz em tal teoria do conhecimento humano assemelha-se ao homem que nunca abandona seu círculo doméstico por receio de que fora dele sua palavra não seja lei.

A verdadeira contemplação filosófica, pelo contrário, encontra sua satisfação no próprio alargamento do não-Eu, em toda coisa que engrandece os objetos contemplados, e desse modo o sujeito que contempla. Na contemplação, tudo aquilo que é pessoal e privado, tudo o que depende do hábito, do auto-interesse ou desejo, deforma o objeto, e, portanto, prejudica a união que a inteligência busca. Levantando uma barreira entre o sujeito e o objeto, as coisas pessoais e privadas tornam-se uma prisão para o intelecto. O livre intelecto enxergará assim como Deus poderia ver: sem um aqui e agora; sem esperança e sem medo; isento das crenças habituais e preconceitos tradicionais: calmamente, desapaixonadamente, com o único e exclusivo desejo de conhecimento - conhecimento tão impessoal, tão puramente contemplativo quanto é possível a um homem alcançar. Por isso, o espírito livre valorizará mais o conhecimento abstrato e universal em que não entram os acidentes da história particular, que ao conhecimento trazido pelos sentidos, e dependente - como tal conhecimento deve ser - de um ponto de vista pessoal e exclusivo, e de um corpo cujos órgãos dos sentidos distorcem tanto quanto revelam.

A mente que se tornou acostumada com a liberdade e imparcialidade da contemplação filosófica preservará alguma coisa da mesma liberdade e imparcialidade no mundo da ação e emoção. Ela encarará seus objetivos e desejos como partes do Todo, com a ausência da insistência que resulta de considerá-los como fragmentos infinitesimais num mundo em que todo o resto não é afetado por qualquer uma das ações dos homens. A imparcialidade que, na contemplação, é o desejo extremo pela verdade, é aquela mesma qualidade espiritual que na ação é a justiça, e na emoção é o amor universal que pode ser dado a todos e não só aos que são considerados úteis ou admiráveis. Assim, a contemplação amplia não somente os objetos de nossos pensamentos, mas também os objetos de nossas ações e nossos sentimentos: ela nos torna cidadãos do universo, não somente de uma cidade entre muros em estado de guerra com tudo o mais. Nesta qualidade de cidadão do mundo consiste a verdadeira liberdade humana, que nos tira da prisão das mesquinhas esperanças e medos.


Enfim, para resumir a discussão do valor da filosofia, ela deve ser estudada, não em virtude de algumas respostas definitivas às suas questões, visto que nenhuma resposta definitiva pode, por via de regra, ser conhecida como verdadeira, mas sim em virtude daquelas próprias questões; porque tais questões alargam nossa concepção do que é possível, enriquecem nossa imaginação intelectual e diminuem nossa arrogância dogmática que impede a especulação mental; mas acima de tudo porque através da grandeza do universo que a filosofia contempla, a mente também se torna grande, e se torna capaz daquela união com o universo que constitui seu bem supremo. 

Bertrand Russell - 1912, Oxford University Press, 1959, reimpresso em 1971-2 - Tradução: Jaimir Conte